Cartórios do Rio são alvo de denúncias por fraudes com documentos falsos, desvios e venda de bens de vítimas

  • 19/10/2025
(Foto: Reprodução)
Documentos legítimos, negócios falsos e prejuízo real: Fantástico investigou falhas cometidas por cartórios no Rio de Janeiro Papel, selo, caneta e carimbo. Objetos simples, mas com o poder de arruinar a vida de alguém. “Mais de 20 anos correndo atrás e você vê o negócio sumir assim, do nada... realmente é revoltante”, afirmou o filho de uma idosa que teve bens perdidos por fraude. “É mais do que traição. É se sentir usado, se sentir manipulado. É uma sensação horrível de impotência mesmo”, disse Raquel Otila, empresária. “Quem vai imaginar que vão te roubar uma sepultura?”, questionou Maria Ana Neves, publicitária. O caso da sepultura O que aconteceu no cemitério São João Batista, na zona sul do Rio de Janeiro, há 20 anos, ainda está cercado de mistério. A história começou quando Maria Ana descobriu que a sepultura da família estava vazia. Os restos mortais da irmã e dos pais, enterrados ali, haviam desaparecido. “Entrei em pânico. Foi aí que comecei a tentar entender o que estava acontecendo e pesquisar sobre esse assunto”, contou Maria Ana Neves. A sepultura havia sido vendida por R$ 60 mil com o uso de uma procuração falsa. “Eu entendi porque esvaziaram o meu jazigo. Era pra vender. Pro meu espanto, me aparece uma procuração com uma assinatura completamente diferente da minha”, relatou Maria Ana Neves. A perícia da Polícia Civil comprovou: a assinatura era falsa. O cartório que reconheceu a assinatura como verdadeira foi o 16º Ofício de Notas, na zona sul do Rio. No fim do ano passado, a Corregedoria do Tribunal de Justiça do Rio puniu a tabeliã Olívia Motta Scisinio com 30 dias de afastamento. Após recurso, a pena foi substituída pelo pagamento de multa. Procurada pelo Fantástico, a defesa da tabeliã informou apenas que se manifestou no processo. Na última sexta-feira, a Justiça cancelou a procuração falsificada e devolveu a propriedade do jazigo a Maria Ana. “Até hoje eu não sei onde foram parar os restos mortais da minha família. Eu acho que eles foram para um ossário público, foram incinerados ou foram para o lixo mesmo”, lamentou Maria Ana Neves. O caso Bid Alcebíades Paes Garcia, o Bid, foi fuzilado ao chegar em casa após o carnaval na Sapucaí, em 2020. Três meses depois, ele teria registrado a própria assinatura em cartório. O 12º Ofício de Notas reconheceu a firma de Bid quatro vezes após sua morte. O 15º Ofício fez isso nove vezes. Um dos documentos permitiu a venda de uma moto aquática que pertencia ao bicheiro. O cartório marítimo percebeu a falsificação e acionou a polícia. “Havendo essa lesão, a gente vai ter que apurar para saber em que circunstâncias ela teria acontecido, a motivação e as pessoas todas que teriam concorrido para que essa lesão acontecesse”, afirmou Marcos Buss, delegado da Polícia Civil. Pedro Castilho, tabelião do 12º Ofício, e Fernanda Leitão, do 15º, foram punidos com suspensão pela Corregedoria da Justiça. A decisão destacou que houve negligência no gerenciamento dos cartórios. Pedro Castilho não quis comentar. A pena está suspensa por liminar do STJ. “Não importa as camadas de segurança que a gente implementa, não importa os níveis de mecanismos que a gente implementa para tentar evitar fraude. Eu sempre vou contar com a falha humana e com a ação criminosa”, disse Paulo Camargo, consultor de compliance do 15º Ofício. “Quando recai dúvida sobre a autenticação de uma assinatura, o que está em risco é a segurança de todos os negócios jurídicos que são celebrados na sociedade”, afirmou o delegado Marcos Buss. Cartórios do Rio são alvo de denúncias por fraudes com documentos falsos, desvios e venda de bens de vítimas. Fantástico O caso Suassuna Raquel Otila mora em Portugal e denunciou à polícia uma suspeita de fraude. Ela nega ter assinado cinco documentos: quatro procurações e um contrato. Por 16 anos, foi casada com o ex-senador Ney Suassuna, do Republicanos. Após o fim do casamento, os dois não entraram em acordo sobre a divisão dos bens. “Nessa época eu já não morava no Brasil. Eu sequer estava no país. Então, é impossível que eu tivesse assinado presencialmente essas procurações”, afirmou Raquel Otila. Ela apresentou à Polícia Civil um documento da Polícia Federal que comprova que não estava no Brasil nas datas das assinaturas, entre maio de 2020 e novembro de 2021. Na semana passada, o Ministério Público denunciou uma funcionária do cartório e Ney Suassuna por falsificação de documento público. A denúncia foi rejeitada pela Justiça por falta de provas. O MP ainda não foi notificado da decisão e pode recorrer. A investigação contra o cartório continua na Corregedoria Geral da Justiça. Ney Suassuna não quis gravar entrevista. Em depoimento à polícia, negou ter falsificado documentos e disse que pretende processar Raquel por denunciação caluniosa. A Corregedoria abriu processo disciplinar para apurar possível falha gerencial da tabeliã Fernanda Leitão. “É impossível exigir que a tabeliã seja onipresente, esteja ao lado de todos os funcionários 24 horas por dia enquanto eles praticam os seus atos. Se assim o fosse, não teria razão de ser dela ter funcionários”, afirmou Paulo Camargo. O caso do precatório Durante a pandemia, uma senhora de 82 anos recebeu uma carta da Receita Federal informando que havia caído na malha fina por não declarar um milhão de reais. A família descobriu que ela tinha direito a um precatório — uma ordem judicial para pagamento de dívidas do governo — mas o dinheiro nunca chegou à conta dela. “Depois de tantos anos batalhando por uma coisa, realmente é revoltante”, disse o filho da idosa, que preferiu não se identificar. A chave do golpe foi uma procuração falsificada. Pelo documento, a idosa autorizava a advogada Laís Vale a sacar o dinheiro. A assinatura foi reconhecida por autenticidade no 15º Ofício de Notas. A família procurou a polícia. Laís passou a ser investigada e teve o sigilo fiscal quebrado. O extrato bancário mostrou que o valor foi transferido para sua conta. No dia seguinte, mais de R$ 600 mil foram repassados para outra conta. A advogada acusa Daniel Solis, que trabalhava no escritório responsável pelo processo, de ter pedido que ela recebesse o dinheiro. “Eu não tinha conhecimento que essa procuração era falsa, com assinatura falsa. Ele me pediu pra eu receber o dinheiro e deixar na minha conta a parte dele”, afirmou Laís Vale. “Eu acreditava que era de honorários da parte do Daniel. Em nenhum momento eu fiquei com dinheiro da idosa. Vou à delegacia, vou prestar meu esclarecimento. Vou falar o que tiver que falar”, completou Laís Vale. O depoimento da advogada está marcado para amanhã. Daniel Solis ainda não prestou depoimento e não respondeu aos contatos da reportagem. A responsabilidade dos tabeliães O tabelião responde pessoalmente pelos atos praticados por seus substitutos ou escreventes autorizados. A lei prevê quatro punições para tabeliães: Repreensão; Multa; Suspensão de até 120 dias; Perda da delegação. A mais grave é a perda da delegação, que afasta o profissional em definitivo do cartório. Foi o que aconteceu com Gilberto Gonçalves Augusto, responsável pelo 4º Ofício de Justiça de São Gonçalo. Ele também assumiu outro cartório após a morte do tabelião titular. Gilberto Augusto foi acusado de desviar dinheiro público que deveria ter sido repassado ao fundo do Tribunal de Justiça. Nesta semana, a Corregedoria manteve a punição. Ainda cabe recurso. Procurado, ele e seu advogado não responderam. LEIA MAIS Uber muda regras e anuncia carros que não serão mais aceitos em 2026; veja lista completa QUIZ: entenda sua personalidade e saiba o tipo de carro que mais combina com você Novo Honda WR-V chega com espaço maior do que a média e preço abaixo de R$ 150 mil; VÍDEO Novas regras e mais punições A tabeliã Fernanda Leitão recebeu outra punição: 75 dias de afastamento após a polícia encontrar selos do cartório dela em uma loja investigada por vender carros roubados com documentos falsos. O advogado da tabeliã afirmou que o cartório está recorrendo de todas as punições citadas na reportagem. “Hoje o 15º Ofício de Notas é um dos maiores cartórios de notas do Brasil. A gente acumula, nos últimos cinco anos, praticamente seis milhões de atos. Temos menos de 0,01% de atos questionados. E, dentre esses, estão inseridos esses quatro casos”, afirmou Paulo Camargo. “Foram reforçados os procedimentos de segurança do cartório. Hoje a gente tem trocas de senha, autenticação de dois fatores... melhoramos muito nosso mecanismo”, completou Paulo Camargo. Na semana passada, enquanto o Fantástico gravava esta reportagem, a Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Rio publicou novas regras. Os cartórios serão obrigados a tirar fotos ou coletar impressão digital no momento da abertura de firma. Além disso, atos como escrituras, procurações públicas, atas notariais e testamentos deverão ser gravados em vídeo. ✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 Carros no WhatsApp Encerramento distante Para as vítimas, o desfecho dos casos está longe de um fim. “Acho que a gente tem uma luta aí pela frente. Eu não quero que isso fique impune de jeito nenhum. De jeito nenhum”, afirmou a filha da idosa vítima do golpe do precatório. “Tudo isso está na Justiça, está sendo investigado. E eu espero que a verdade apareça, só isso”, disse Raquel Otila. O que diz a Corregedoria-Geral da Justiça do Rio de Janeiro Em nota, a Corregedoria-Geral da Justiça do Rio reafirmou o compromisso com a integridade e a transparência no exercício da fiscalização. Ressaltou ainda que todos os indícios de irregularidades ou desvio de conduta são tratados e apurados com o máximo rigor, sempre de forma técnica, célere e responsável. Também em nota, o Colégio Notarial do Brasil, que representa mais de oito mil tabelionatos no país, defendeu a urgência na integração entre todas as bases de dados dos órgãos de identificação civil. A entidade afirmou que a medida vai fortalecer os mecanismos de verificação de identidade e aperfeiçoar a segurança jurídica na prática dos atos. A Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro informou que abriu um processo ético-disciplinar para apurar a conduta da advogada Laís Vale. Em relação ao advogado Daniel Sóllis, a OAB disse que todos os fatos novos serão objeto de apuração. Sobre a venda da sepultura, entramos em contato com o escritório de advocacia que atende à Santa Casa de Misericórdia, responsável pelo jazigo na época da falsificação da procuração, mas não tivemos retorno. Ouça os podcasts do Fantástico ISSO É FANTÁSTICO O podcast Isso É Fantástico está disponível no g1 e nos principais aplicativos de podcasts, trazendo grandes reportagens, investigações e histórias fascinantes em podcast com o selo de jornalismo do Fantástico: profundidade, contexto e informação. Siga, curta ou assine o Isso É Fantástico no seu tocador de podcasts favorito. Todo domingo tem um episódio novo.

FONTE: https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2025/10/19/cartorios-do-rio-sao-alvo-de-denuncias-por-fraudes-com-documentos-falsos-desvios-e-venda-de-bens-de-vitimas.ghtml


#Compartilhe

Aplicativos


Locutor no Ar

Peça Sua Música

Top 10

top1
1. (Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

(Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

top2
2. (Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

(Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

top3
3. (Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

(Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

top4
4. (Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

(Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

top5
5. (Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

(Jornalismo(all news Luiz Bahia News)).

top6
6.

top7
7.

top8
8.

top9
9.

top10
10.


Anunciantes